
O que são as Gueixas?
As gueixas são figuras emblemáticas da cultura tradicional japonesa, conhecidas por suas habilidades artísticas refinadas e sua elegância. A palavra “gueixa” (芸者) significa literalmente “pessoa da arte”, refletindo sua dedicação a expressões como dança, música, canto, conversação, etiqueta e a cerimônia do chá. Ao contrário de um equívoco comum, as gueixas são exclusivas do Japão e não têm origem chinesa.
Origem Histórica: O Surgimento das Gueixas
As gueixas, figuras icônicas da cultura japonesa, surgiram durante o Período Edo (1603–1868). Curiosamente, os primeiros profissionais da arte do entretenimento eram homens, chamados taikomochi ou koukan. Eles se apresentavam em casas de chá e eventos privados, utilizando suas habilidades em música, poesia e conversação para entreter a elite da época. Eles também utilizavam maquiagem branca (oshirōi), característica posteriormente associada às gueixas, mas que na época era exclusiva do universo masculino.
Com o passar dos anos, a profissão passou por uma transformação significativa, tornando-se predominantemente feminina. As mulheres começaram a se destacar nesse universo artístico, aperfeiçoando-se em dança, canto, instrumentos tradicionais e etiqueta refinada. Assim, consolidou-se a figura da gueixa como conhecemos hoje.
O Período de Ouro: Século XIX até a Segunda Guerra Mundial
A chamada “era de ouro” das gueixas ocorreu durante o século XIX e perdurou até o início da Segunda Guerra Mundial. Nesse período, havia dezenas de milhares de gueixas espalhadas por regiões como Kanazawa e Asakusa. A profissão era reconhecida e até incentivada pelo governo Meiji, sendo comum a presença de gueixas em casas de chá e salões frequentados por samurais e aristocratas.
O Polêmico Mizuage
Um aspecto frequentemente mal compreendido da cultura gueixa é o ritual chamado mizuage, popularizado no ocidente pelo livro Memórias de uma Gueixa, de Arthur Golden. Esse ritual marcava simbolicamente a transição de uma jovem para a idade adulta, envolvendo, em alguns casos, a perda da virgindade. No entanto, nem todas as comunidades de gueixas praticavam esse costume, e ele era até desencorajado em diversos hanamachi (bairros de gueixas). Quando acontecia, tratava-se de um rito de passagem cultural, e não de um serviço comercial ou sexual.
Com a promulgação da Lei de Abolição da Prostituição em 1957, o governo japonês oficializou a separação entre a figura da gueixa e a prostituição, reforçando seu papel como artista. Além disso, tornou-se obrigatório que as meninas frequentassem a escola até os 16 anos, o que contribuiu para a redução no número de novas gueixas.

A Gueixa no Japão Contemporâneo
Nos dias de hoje, a presença de gueixas é muito menor do que nas décadas anteriores à guerra. Estima-se que haja cerca de 1000 em Tóquio e Kyoto, com a maior concentração atuando no bairro de Gion, em Kyoto. Elas ainda se apresentam em casas de chá e restaurantes tradicionais chamados ryōtei, mantendo vivas as tradições artísticas do Japão.
O treinamento para se tornar uma gueixa é rigoroso e requer anos de dedicação. As jovens aprendizes, chamadas maiko, dedicam-se ao estudo da música, da dança, do canto, da etiqueta e da conversação refinada. Em Kyoto, a gueixa já formada é conhecida como geiko. Mesmo após a formação, o aprendizado continua ao longo de toda a carreira.
Apesar da modernização, a profissão permanece relevante e respeitada, representando um elo entre o passado e o presente do Japão.
Características Culturais e Simbólicas das Gueixas
- Maquiagem: O rosto pintado de branco é uma marca icônica. Essa prática visava destacar os traços faciais em ambientes com iluminação fraca, como salas iluminadas por velas.
- Vestuário: O quimono tradicional, os penteados ornamentados e os tamancos altos (geta) fazem parte do visual característico das gueixas.
- Função: A principal função da gueixa é entreter por meio das artes. Embora em alguns momentos históricos tenham sido confundidas com cortesãs, as gueixas nunca tiveram como foco atividades sexuais.
Diferenças entre Gueixas, Oiran(Cortesãs) e Prostitutas
É importante distinguir as gueixas de outras figuras femininas do passado japonês:
- As gueixas são artistas dedicadas ao entretenimento cultural.
- As oiran, por outro lado, eram cortesãs de luxo, cujo papel envolvia serviços sexuais, além de refinamento.
- Já as prostitutas atuavam fora do sistema artístico e não recebiam o mesmo treinamento.
As distinções são claras, especialmente quanto à natureza do serviço e à formação exigida.
Formação e Vida das Gueixas
- Okiya: Antigamente, as futuras gueixas eram acolhidas por casas especializadas chamadas okiya, onde iniciavam o aprendizado ainda na infância.
- Treinamento: As aprendizes aprendem a tocar instrumentos como o shamisen(banjo japones), praticam a cerimônia do chá, desenvolvem habilidades sociais e dominam regras rígidas de etiqueta.
- Dedicação: O treinamento é contínuo e exige comprometimento ao longo da vida.
Gueixas Podem se Casar?
Sim, embora a tradição imponha restrições. Caso decidam se casar ou ter filhos, muitas gueixas encerram sua carreira, uma vez que a profissão exige dedicação quase exclusiva. No entanto, nos tempos atuais, algumas exceções têm ocorrido, refletindo mudanças nos valores sociais. O código ético das gueixas privilegia a discrição e a confidencialidade, o que pode ser desafiado pela vida familiar.
Taikomochi ou Houkan: As Gueixas Masculinas
Os taikomochi — precursores masculinos das gueixas — eram comuns em períodos anteriores à ascensão das gueixas femininas. Embora hoje em dia sejam raríssimos, ainda existem artistas que mantêm viva essa tradição, apresentando-se em eventos especiais.
Curiosidades sobre as Gueixas
- O termo “gueixa” originalmente se referia a homens artistas.
- A primeira gueixa do sexo feminino reconhecida foi Fukagawa, uma ex-prostituta que começou por volta de 1750.
- No passado, famílias em situação de pobreza vendiam filhas a casas de gueixas para treinamento.
- A idade para iniciar o aprendizado costumava ser em torno dos nove anos. Hoje, inicia-se após o ensino médio.
- O treinamento inclui não apenas arte, mas também sociabilidade e refinamento.
O Declínio da Profissão
No início do século XX, havia cerca de 80 mil gueixas em atividade. Hoje, esse número não ultrapassa dois mil. A ocidentalização, as mudanças culturais e o surgimento de novas formas de entretenimento contribuíram para esse declínio. Ainda assim, o prestígio simbólico e cultural das gueixas permanece intacto.
Turismo e Restrições em Gion, Kyoto
Em 2024, o aumento do turismo e o comportamento inadequado de alguns visitantes levou à implementação de restrições em ruas específicas do distrito de Gion. A proibição parcial de entrada de turistas visa preservar a integridade das gueixas e dos moradores locais. Em áreas específicas, apenas residentes, clientes de estabelecimentos e as próprias gueixas têm acesso permitido.
Placas informativas alertam para o respeito à privacidade e ao patrimônio local. Ignorar essas normas pode resultar em multas de até 10 mil ienes. Visitantes que desejam conhecer Gion devem fazê-lo com respeito, evitando toques nos trajes tradicionais ou aproximações invasivas.
Conclusão: As Gueixas como Patrimônio Vivo do Japão
As gueixas permanecem como um dos símbolos mais refinados da cultura japonesa. Apesar das transformações sociais e da diminuição de seu número, elas continuam a representar a beleza, a graça e o compromisso com as artes tradicionais. Para quem visita o Japão, especialmente Kyoto, conhecer o mundo das gueixas é mergulhar em séculos de história, disciplina e delicadeza cultural.